tag:blogger.com,1999:blog-75226050267359599702024-03-13T13:21:01.807-04:00The Way of My SoulThe Way of My Soulhttp://www.blogger.com/profile/06932685159747043984noreply@blogger.comBlogger3125tag:blogger.com,1999:blog-7522605026735959970.post-14790653236597800132013-03-31T01:44:00.000-04:002013-03-31T02:19:52.536-04:00TABACARIA de Fernando Pessoa (Álvaro de Campos, 15-1-1928)Não sou nada.<br />
Nunca serei nada. <br />
Não posso querer ser nada.<br />
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.<br />
<br />
Janelas do meu quarto,<br />
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é<br />
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),<br />
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,<br />
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,<br />
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,<br />
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,<br />
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,<br />
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.<br />
<br />
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.<br />
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,<br />
E não tivesse mais irmandade com as coisas<br />
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua<br />
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada<br />
De dentro da minha cabeça,<br />
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.<br />
<br />
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.<br />
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo<br />
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,<br />
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.<br />
<br />
Falhei em tudo.<br />
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.<br />
A aprendizagem que me deram,<br />
Desci dela pela janela das traseiras da casa.<br />
Fui até ao campo com grandes propósitos.<br />
Mas lá encontrei só ervas e árvores,<br />
E quando havia gente era igual à outra.<br />
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?<br />
<br />
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?<br />
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!<br />
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!<br />
Gênio? Neste momento<br />
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,<br />
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,<br />
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.<br />
Não, não creio em mim.<br />
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!<br />
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?<br />
Não, nem em mim...<br />
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo<br />
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?<br />
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -<br />
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,<br />
E quem sabe se realizáveis,<br />
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?<br />
O mundo é para quem nasce para o conquistar<br />
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.<br />
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.<br />
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,<br />
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.<br />
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,<br />
Ainda que não more nela;<br />
Serei sempre o que não nasceu para isso;<br />
Serei sempre só o que tinha qualidades;<br />
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,<br />
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,<br />
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.<br />
Crer em mim? Não, nem em nada.<br />
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente<br />
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,<br />
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.<br />
Escravos cardíacos das estrelas,<br />
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;<br />
Mas acordamos e ele é opaco,<br />
Levantamo-nos e ele é alheio,<br />
Saímos de casa e ele é a terra inteira,<br />
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.<br />
<br />
(Come chocolates, pequena;<br />
Come chocolates!<br />
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.<br />
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.<br />
Come, pequena suja, come!<br />
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!<br />
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,<br />
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)<br />
<br />
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei<br />
A caligrafia rápida destes versos,<br />
Pórtico partido para o Impossível.<br />
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,<br />
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro<br />
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,<br />
E fico em casa sem camisa.<br />
<br />
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,<br />
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,<br />
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,<br />
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,<br />
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,<br />
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,<br />
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -<br />
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!<br />
Meu coração é um balde despejado.<br />
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco<br />
A mim mesmo e não encontro nada.<br />
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.<br />
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,<br />
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,<br />
Vejo os cães que também existem,<br />
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,<br />
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)<br />
<br />
Vivi, estudei, amei e até cri,<br />
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.<br />
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,<br />
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses<br />
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);<br />
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo<br />
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente<br />
<br />
Fiz de mim o que não soube<br />
E o que podia fazer de mim não o fiz.<br />
O dominó que vesti era errado.<br />
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.<br />
Quando quis tirar a máscara,<br />
Estava pegada à cara.<br />
Quando a tirei e me vi ao espelho,<br />
Já tinha envelhecido.<br />
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.<br />
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário<br />
Como um cão tolerado pela gerência<br />
Por ser inofensivo<br />
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.<br />
<br />
Essência musical dos meus versos inúteis,<br />
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,<br />
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,<br />
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,<br />
Como um tapete em que um bêbado tropeça<br />
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.<br />
<br />
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.<br />
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada<br />
E com o desconforto da alma mal-entendendo.<br />
Ele morrerá e eu morrerei.<br />
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.<br />
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.<br />
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,<br />
E a língua em que foram escritos os versos.<br />
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.<br />
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente<br />
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,<br />
<br />
Sempre uma coisa defronte da outra,<br />
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,<br />
Sempre o impossível tão estúpido como o real,<br />
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,<br />
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.<br />
<br />
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)<br />
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.<br />
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,<br />
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.<br />
<br />
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los<br />
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.<br />
Sigo o fumo como uma rota própria,<br />
E gozo, num momento sensitivo e competente,<br />
A libertação de todas as especulações<br />
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.<br />
<br />
Depois deito-me para trás na cadeira<br />
E continuo fumando.<br />
Enquanto o Destino me conceder, continuarei fumando.<br />
<br />
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira<br />
Talvez fosse feliz.)<br />
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.<br />
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).<br />
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.<br />
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)<br />
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.<br />
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo<br />
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.<br />
The Way of My Soulhttp://www.blogger.com/profile/06932685159747043984noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7522605026735959970.post-80915463144507468352012-06-09T18:17:00.002-04:002012-06-11T21:32:40.651-04:00Obituary: Ray BradburyAs far as I can remember, I have a passion for books, libraries and bookstores. I love to be surrounded by books, I love to touch them, I love the sound of turning pages and, yes, I love their smell too! Each book is like a person, it has its own history and personality, but with the advantage of always being open to you! A book wants to be chosen, to be read, to be loved and, ultimately, to became part of you! Every book is a reflexion of its author. And when you read a book, liking it or not, you'll forever carry a little bit of that author within you! Thus, always remember to choose wisely the messenger to avoid carrying an unwanted message! <br />
<br />
Ray died this week. I have no words to express my sadness, thus, I rushed to re-read one of my favourites, Fahrenheit 451. One last tribute to a man that helped to shape the person that I am today.<br />The Way of My Soulhttp://www.blogger.com/profile/06932685159747043984noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7522605026735959970.post-74380971734112966732012-01-25T09:47:00.000-05:002013-03-31T01:50:56.364-04:00In Memoriam A.H.H. (Lord Tennyson)Be near me when my light is low,<br />
When the blood creeps, and the nerves prick<br />
And tingle; and the heart is sick,<br />
And all the wheels of Being slow.<br />
<br />
Be near me when the sensuous frame<br />
Is rack'd with pangs that conquer trust;<br />
And Time, a maniac scattering dust,<br />
And Life, a Fury slinging flame.The Way of My Soulhttp://www.blogger.com/profile/06932685159747043984noreply@blogger.com2